Caro irmão, “eu repreendo e educo os que eu amo” (Ap 3,19).
O retiro anual na vida de um sacerdote é um dos momentos mais significativos e importantes na sua programação espiritual-pastoral. O momento e o tempo do retiro não são nossos. São momento e tempo de Deus. Aliás, nem mesmo nós somos nossos. Deus também não é nosso. Nós é que somos de Deus. Mas, “não é necessário que alguém me apresente diante de Deus. Sei que sou mais d’Ele que de mim mesmo e eu nada seria se me separasse d’Ele. Essa realidade desconcertante me ultrapassa. Uma vez descoberta e aceita, me abre possibilidades infinitas como ser humano” (Fray Marcos).
Por experiência própria, o retiro na vida de um sacerdote é uma espécie de “curso de gestão” ou de “planejamento estratégico” para uma REFORMA de VIDA. Um bom retiro é como uma cirurgia para a retirada de um corpo estranho e doente do nosso organismo. Haverá sempre um tempo de convalescência para que a cura seja completa. O tempo de convalescência faz parte integrante deste processo de cura e de autoconhecimento interior. O retiro é também uma pausa na caminhada, um momento de respiro para a oxigenação do espírito, da mente, do corpo e do coração para a missão. Os materiais rezados, durante o retiro, devem ser assimilados e revisitados por um período razoável. O dito ou o não dito fazem parte deste processo. O pós-retiro é como o descimento do Tabor: lá embaixo, a multidão nos espera (Mc 9,14ss; Mt 17,9ss; Lc 9,37ss). Tudo isto porque o retiro é paradigmático e programático. É preciso curtir estes tempos.
No retiro se redescobre a centralidade de Jesus na nossa vida. É preciso buscar Deus por aquilo que Ele é e não somente por aquilo que Ele pode nos dar. O mesmo se diga a respeito da Igreja: é preciso buscar na Igreja por aquilo que ela é e não por aquilo que ela pode nos dar. Eis, pois, um testemunho. Foi encontrado, em um escrito de Dom Luciano, durante uma viagem, de avião, voltando de Roma: “O que a Igreja me pedir eu vou amar e fazer”.
O mal da nossa época é o que convencionamos chamar de ansiedade, de dispersão, de perda do foco, de falta de imaginação e de contemplação das teografias na nossa vida e na nossa história. Neste itinerário memorial de vida, três perguntas se fazem necessárias: O que fiz? O que faço? E o que farei para agradar a Deus? Para respondê-las, proponho que demos juntos quatro passos na rota anamnético-memorial:
Primeiro passo: Peregrinar na Esperança, em comunhão, participação e missão: viver juntos, caminhar juntos (syn hodos), evangelizar juntos, no êxodo da vida e da missão da nossa Igreja, atraídos pelos olhares em Jesus, o nosso primeiro Amor. A imagem da Igreja sinodal, em saída, acidentada, enlameada, hospital de campanha etc, não é o desejo apenas de um certo papa. É o que Jesus, no seu Evangelho, pede de cada um de nós. Jesus nos dá as luzes destas ideias, a fim de que possamos colocá-las em prática. Apenas uma pergunta: o Sínodo faz sentido para mim? Diz alguma coisa para mim? Vamos transformar este tempo de pós-retiro em um Ano Santo da Pastoral Sinodal?
Segundo passo: Peregrinar na Esperança, no Ano Santo Jubilar, da Graça do Senhor. No caminho de Jerusalém a Emaús, em que Jesus caminha com dois dos discípulos, Ele dá vida à memória deles, fazendo-os revisitar todas as passagens da Escritura que se referiam a Ele mesmo. Esta passagem pela Escritura ressuscita a memória, fazendo arder o coração e dando condições de reconhecê-Lo na fração do pão (Lc 24,19ss). Como aos discípulos de Emaús, a imagem do peregrino da esperança deveria abrir os nossos olhos e aquecer os nossos corações. A esperança nasce do Mistério Pascal de Jesus e se alimenta das incertezas do mundo. São Paulo diz que a “tribulação produz a perseverança. A perseverança a virtude comprovada. A virtude comprovada a esperança. E a esperança não decepciona” (Rm 5,3-5). Vamos transformar este Ano Jubilar em um Ano Santo Pastoral de Peregrinos da Esperança?
Terceiro passo: Peregrinar na Esperança, rumo à nossa Assembleia de Pastoral. Nesta Assembleia caberá muito o redobrado empenho e o esforço de todos. O poder de decisão faz parte de um processo de escuta ao Espírito Santo e a nós. Esta, talvez, seja a minha última Assembleia com vocês. Outros virão e farão mais e melhor do que eu. No entanto, é preciso viver bem feito o processo, fechar bem este ciclo que se estendeu mais do que eu imaginei e mereço. Precisamos de todos, de todos, de todos (Papa Francisco). Portanto, neste Ano Santo da nossa Assembleia, somos chamados a ser homens (sacerdotes) melhores, mais humanos e mais santos: “O humano autêntico é cristão e o cristão autêntico é humano” (Padre França Miranda). Não podemos queimar etapas e nem rifar o nosso assessor. Por favor, não me façam este desfeito de me deixar sozinho. Vamos transformar este ano em um Ano Santo de Assembleia de Pastoral?
Quarto passo: Peregrinar na Esperança do cuidado da nossa Casa Comum (CF-2025: Fraternidade e Ecologia Integral). Jesus falava de Deus sem usar o nome de Deus. Usava as palavras como figueira, semente, fermento, pérola, tesouro, pastor, agricultor, rede, moeda, pai, filho, mulher… é curioso, mas estas imagens simbolizam a presença, a graça e a ação e o Reino de Deus. Eu me ordenei sacerdote em uma Praça Pública e bispo em um local chamado de “Bosque das Algarobas”. Sou o autor do Pecado Ecológico (DFS 82). Sou vice-presidente da REPAM-Brasil. E o criador dos Guardiões Ecológicos. Vamos transformar este ano em um Ano Santo da Pastoral da Ecologia Integral?
Jesus certamente não nos chamou para praticar uma tarefa e exercer uma função, mas para participar da sua vida (Mc 3,13ss). Geralmente nós não somos chamados a plantar. O agricultor é Deus. E Jesus é a Videira verdadeira. E nós somos os ramos (Jo 15,1ss). Com a condição de permanecermos unidos, em seu amor (Jo 15,4.6.7.9). Somos chamados a colher e a recolher o que o Senhor plantou na nossa vida. Peçamos ao Senhor da messe que envie mais operários para esta colheita.
O Anjo do Senhor pede à Igreja que escute o que o Espírito lhe diz (Ap 2,7.11.17.28; 3,6.13.21.). Por onde o Espírito Santo entra em nós? Pelos ouvidos? Pela escuta e pelo discernimento? Ou por onde mais? Só o descobre isto quem lê, vive e pratica o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. É a sabedoria do Evangelho invadindo o coração e a alma de um homem de Deus. Neste pós-retiro vamos todos pedir a graça do conhecimento interno e pessoal de Jesus para mais e melhor amá-lo e servi-lo. Que sejamos todos servos bons e fiéis e não servos maus e preguiçosos (Mt 25,14-30).
Por fim, é interessante como todas as virtudes humanas giram em torno das quatro virtudes cardeais, frutos da sabedoria (sábios): a Fortaleza (fortes, firmes, corajosos); a Prudência (serenos, calmos, sensatos); a Justiça (justos, corretos, justificados); e a Temperança (equilibrados, comedidos, temperados). Estes são os bens mais úteis na vida (Platão, Sb 8,7; CIC 1805-1809). À luz destas virtudes, destaco, mesmo se de forma telegráfica, as três atitudes que precisamos pôr em prática: tratar bem e cuidar bem dos que já são nossos; acolher bem os que estão votando ou chegando, mesmo se timidamente; e ir atrás dos afastados e desigrejados.
Este ano eu escolhi para guiar meus passos: ser mais incisivo, mais proativo, mais propositivo e mais paterno. Esta minha identidade existencial todos sabem e conhecem: “Tenho sede”. O cardeal José Tolentino pergunta: – “De quem Jesus tem sede?” A resposta dele é: – “De ti, da tua fé, da tua presença, te teu sim, da sede que tu possas ter de Deus, da falta que habita em ti e desejo de salvação que suscita em ti…”
Por favor, me ajudem a ser assim para que onde cair um pingo de água nasça um peregrino de esperança.
Então, tenhamos sede, todos, todos, todos, juntos. Amém!
Muito agradecido!
Dom Pedro Brito Guimarães
Itaici – SP, 11/01/2025